Clima Ameno #1: mais cortes, menos mortes e as mesmas zonas húmidas
A dose semanal de notícias que não aquecem nem arrefecem.
Alemanha reduziu emissões de CO2 para níveis de 1950
Em 2023, as emissões de CO2 da Alemanha caíram para o nível mais baixo desde a década de 1950, devido:
- à inesperada diminuição do uso de carvão para a electricidade para o nível mais baixo de 1960, o que permitiu ao país poupar 44 milhões de toneladas de CO2;
- ao aumento da produção interna de energias renováveis, que tem agora uma quota de mais de 50%; e
- à queda de 11% da produção de indústrias de alto consumo energético, o que permitiu diminuir as emissões em 12% face a 2022, para 144 milhões de toneladas de CO2.
A surpresa da primeira causa e as previsões quanto à recuperação das indústrias da última são a razão pela qual esta notícia não traz más notícias ao planeta mas também não garante nada: esta quebra nas emissões é insustentável sem alterações na política climática alemã.
Podes ler o comunicado e o estudo publicado pelo think tank Agora Energiewende aqui (em inglês) >
Corte nos combustíveis fósseis evitou 225 mil mortes prematuras
O 2023’s Report of the Lancet Countdown on Health and Climate Change (Relatório de Contagem Decrescente da Lancet sobre Saúde e Alterações Climáticas de 2023, em português), um estudo que envolve 114 cientistas e profissionais de saúde de 52 instituições, esforça-se muito para trazer boas notícias, e traz:
- o setor das energias renováveis cresceu para um máximo histórico de 12,7 milhões de funcionários em 2021;
- os empréstimos ao sector da energia verde aumentaram para 498 mil milhões de dólares em 2021, aproximando-se, finalmente, dos empréstimos para combustíveis fósseis; e
- as mortes atribuíveis à poluição atmosférica causada pela queima de combustíveis fósseis diminuíram 17,7% desde 2005, sendo que 80% desta redução resultou da diminuição da poluição derivada da queima de carvão para produção de energia elétrica.
Entre 2005 e 2020, as mortes anuais atribuíveis às partículas PM2,5, ligadas à queima de combustíveis fósseis, caíram de 1.437.000 para 1.212.000
Este relatório da Lancet afirma que as ambições do Acordo de Paris ainda são realizáveis e que um futuro próspero é possível mas passa muito mais páginas a provar que o atraso da humanidade na implementação de medidas para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa já está a ter graves consequências sob a forma de mortes relacionadas com o calor, insegurança alimentar, problemas de acesso à água, perdas económicas, etc.
Os autores denunciam a “negligência dos governos, empresas e bancos que continuam a investir dinheiro na indústria do petróleo e do gás”. E o relatório adverte que, “Sem uma resposta rápida para corrigir o rumo, a utilização persistente e a expansão dos combustíveis fósseis garantirão um futuro cada vez mais injusto que ameaça a vida de milhares de milhões de pessoas que vivem hoje”.
Podes consultar o relatório e outros recursos em diversos formatos aqui >
Espanha alcança acordo de 1,4 mil milhões de euros para salvar zonas húmidas da Andaluzia
É um acordo histórico, conseguido pela ministra do Ambiente de Espanha, Teresa Ribera, e quer proteger o parque nacional de Doñana, uma das zonas húmidas mais importantes da Europa, localizada no oeste da Andaluzia:
- acaba com uma furiosa disputa nacional e internacional que envolve grupos ambientalistas, a União Europeia e redes multinacionais de supermercados, causada por um plano do governo regional da Andaluzia para oferecer uma amnistia aos agricultores que exploravam ilegalmente o aquífero para irrigar as explorações de bagas na área em redor do parque;
- diversifica a economia local, acabando com a dependência da produção de bagas; e
- resulta da mobilização da opinião pública para impulsionar a transição verde e mitigar os efeitos da emergência climática, estabelecendo um exemplo que outras regiões podem seguir.
Doñana é composta por pântanos, florestas e dunas que se estendem por quase 130 mil hectares e incluem uma Reserva da Biosfera listada pela UNESCO. O abastecimento de água diminuiu drasticamente nas últimas três décadas devido às alterações climáticas, à poluição mineira, à drenagem dos pântanos, ao crescimento exponencial do cultivo de bagas, como morangos e framboesas, em estufas. O Conselho Nacional de Investigação de Espanha concluiu, num relatório de de 2022, que 59% dos grandes lagos de Doñana não estavam cheios desde pelo menos 2013 e que a área estava em “condição crítica”. Nos últimos dois verões, o maior lago permanente de Doñana secou completamente e o parque foi recentemente retirado da lista verde da União Internacional para a Conservação da Natureza por não cumprir os padrões necessários.
Podes ler uma entrevista de Ribera ao The Guardian sobre este acordo aqui >